Olá,
O homem que rasga as entranhas da terra em busca do minério oculto em seu seio;
que desce às profundezas oceânicas explorando seus pélagos e abismos mais recônditos;
que sulca os ares, elevando-se às alturas em vôos mais ousados e destemidos que os do
condor e da águia;
que penetra o mundo do infinitamente pequeno e do infinitamente grande — o microcosmo e o
macrocosmo — devassando suas íntimas e secretas maravilhas;
que doma e submete as feras, desbravando sertões e selvas densas;
que afronta os elementos em fúria, lutando com os temporais, com os terremotos, com as lavas
incandescentes que as crateras vulcânicas
vomitam aos borbotões;
que porfia com a peste, que vence as endemias mais radicadas saneando regiões onde elas
reinavam infrenes;
que se utiliza, em suas cidades e em seus lares, da eletricidade, esse fluido imponderável,
incoercível, desconhecido e misterioso capaz de fulminar num dado instante aqueles que atinge;
que apanha o raio no ar e o conduz por um fio, neutralizando seu poder de destruição;
que apagou as distâncias, unindo os continentes através dos mares e do espaço, pondo em
contacto cotidiano raças, nações e povos do Norte e do Sul, do Oriente e do Ocidente, do Velho
e do Novo Mundo;
que pisou as inóspitas regiões polares onde nenhum sinal de vida se encontra; que realizou
praticamente quase todas as fantasias e sonhos de Júlio Verne;
que já ergueu a ponta do véu que separa os dois planos — da matéria e do Espírito —
perscrutando os arcanos celeste»;
o homem que de todas essas façanhas se vangloria, que de todas essas proezas e feitos se
desvanece e se orgulha, ignora ainda os segredos de sua mente e os mistérios de seu coração!
O homem que enfrenta o inimigo em campo raso, a peito descoberto, no meio de fuzilaria
cerrada; que não recua diante das metralhadoras, dos canhões e dos petardos, não é capaz de
suportar uma pequena ofensa, de ânimo sereno e coração tranuilo!
Não é capaz de desarmar o
agressor, transformando as agressividades em carícias!
O homem que é capaz de destruir cidades seculares em algumas horas; que é capaz de talar
campos e searas em poucos momentos; que é capaz de dizimar multidões, estendendo o negro véu
da orfandade sobre milhares de crianças, é incapaz de vencer vícios vulgares e rasteiros como os
do jogo, do álcool, dos entorpecentes, do tabaco, etc.!
O homem que sabe línguas, ciências, filosofias, política e artes várias, não sabe ser bom e justo,
tolerante e fraterno; não sabe, tão pouco, resolver os problemas da pobreza, da enfermidade e da
dor! Finalmente, o homem que tanto tem conquistado e tanto tem conseguido, ainda não se
conquistou a si mesmo, ainda não conseguiu domar e vencer suas próprias paixões!
Vinícius " Em torno do Mestre"
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