Olá,
(...) Um fato talvez mais importante do que a constatação em termos de quantidade, resultante também de nossas observações, é a seriedade com que se encara o Espiritismo. Onde quer que se pesquise – e podemos dizer: com avidez – busca-se o lado filosófico, moral e instrutivo.
Em nenhum lugar vimos a prática espírita reduzida a motivo para distrações nem as experiências serem conduzidas como diversão. Invariavelmente, as perguntas fúteis e a simples curiosidade são postas de lado. Em sua maioria os grupos são muito bem dirigidos, alguns mesmo de forma notável, com o emprego pleno dos verdadeiros princípios da ciência espírita.
Os propósitos são idênticos aos que norteiam a sociedade de Paris e não se tem outra bandeira senão os princípios ensinados em “O Livro dos Espíritos”. Nesses grupos reina, de modo geral, uma ordem e um recolhimento perfeitos.
Vimos alguns, em Lyon e Bordeaux, que reúnem, habitualmente, cem a duzentas pessoas e onde a atitude geral é tão edificante quanto o seria dentro de uma igreja. Foi em Lyon que tivemos a reunião geral mais importante. Compunha-se de mais de seiscentos delegados de diferentes grupos e tudo transcorreu de forma admirável.
Devemos acrescentar que em nenhuma das localidades visitadas as reuniões espíritas sofreram a mais leve restrição e devemos agradecimentos às autoridades civis pela cortesia de que fomos objeto em mais de uma circunstância.
Os médiuns igualmente se multiplicam e há poucos Centros que não dispõem do concurso de vários deles, sem falar da quantidade bem mais considerável daqueles que não pertencem a nenhum núcleo e que apenas empregam suas faculdades isoladamente ou junto a pequenos grupos de amigos.
Nesse número predominam os psicógrafos de diferentes gêneros. Em grande maioria, entretanto, fazem-se sentir os médiuns moralistas,pouco divertidos para os curiosos, que melhor farão indo procurar distrações alhures do que nas reuniões espíritas verdadeiramente sérias. Lyon possui vários médiuns desenhistas notáveis, um dos quais emprega o óleo sem que jamais tenha tido qualquer lição de desenho ou de pintura, e vários médiuns videntes, cujas faculdades pudemos constatar.
Em Marrennes há também uma senhora, médium desenhista e, igualmente, um ótimo médium psicógrafo, tanto para dissertações espontâneas quanto para evocação.
Em Saint-Jean d’Angély vimos um médium mecânico que podemos considerar excepcional. Trata-se de uma senhora que redige longas e formosas comunicações enquanto lê o jornal ou conversa com os presentes, e isto sem nunca olhar para sua própria mão. Sucede muitas vezes que, distraída, não se apercebe de que a comunicação chegou ao fim.
Os médiuns iletrados são numerosos e muitos há que psicografam sem jamais terem aprendido a escrever. Isso não é mais surpreendente do que ver um médium desenhar sem ter sido iniciado nessa arte. Mas o que é característico, é a evidente diminuição dos médiuns de efeitos físicos, à medida que se multiplicam os médiuns de efeitos intelectuais. É que, como os Espíritos o afirmam, a fase da curiosidade passou e já vivemos um segundo período, o da filosofia. O terceiro, que começará em pouco, será o de sua aplicação à reforma da humanidade.
Os Espíritos, que tudo conduzem com grande sabedoria, tiveram a intenção de, preliminarmente, despertar as atenções para a nova ordem de fenômenos e provar a possibilidade da comunicação com os seres do mundo invisível.
Espicaçando a curiosidade, alcançaram desentorpecer toda a gente, ao passo que se tivessem apresentado, de início, uma filosofia abstrata, não alcançariam ser compreendidos senão por um pequeno número, com o agravante de que a origem dessa filosofia teria sido dificilmente admitida.
Optando por um processo gradativo, mostraram o que podiam realizar. Todavia, como, em definitivo, as consequências morais constituíam sua finalidade essencial, deram às manifestações seu aspecto normal de seriedade quando julgaram suficiente o número de pessoas dispostas a ouvi-los, pouco se inquietando com os recalcitrantes.
Quando a ciência espírita estiver solidamente constituída e escoimada de todas as interpretações sistemáticas e errôneas, que caem a cada dia ante o exame sério, eles se ocuparão de estabelecê-la em âmbito universal, para isso empregando poderosos meios. Enquanto esperam, semeiam a idéia por todo o mundo, a fim de que, quando o momento estiver chegado, ela encontre, por toda parte, o terreno preparado. E saberão bem como superar todos os entraves, pois o que podem contra eles e contra a vontade de Deus os obstáculos humanos?
Essa caminhada racional e prudente se revela em tudo, mesmo nos mais sutis ensinamentos que gradualmente proporcionam de acordo com o tempo, os lugares e os hábitos dos homens. Uma luz intensamente brilhante e súbita não ilumina, mas ofusca. Assim sendo, os Espíritos oferecem-na de pouco em pouco. Quem quer que acompanhe o progresso da ciência espírita reconhecerá que ela cresce em importância à medida que penetra os mais profundos mistérios. O Espiritismo discute, hoje em dia, idéias das quais não se duvidava há alguns anos, e ele não disse ainda a última palavra, pois que reserva muitas outras revelações.
Allan Kardec
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